Curso – Por que postamos: a antropologia das mídias sociais

O curso Por que postamos: a antropologia das mídias sociais é um material gratuito e online da UCL (University College London) via UCLeXtend. Trata-se de uma jornada de cinco semanas (mas você  pode realizar as atividades em seu tempo) para expor os resultados de pesquisas antropológicas sobre o consumo de mídias sociais realizadas em diferentes localidades do mundo (Inglaterra, Turquia, Ilha de Trinidad, Brasil, Itália, Índia, Chile, China), além desse conteúdo também tem a oferta de leituras sugeridas, vídeos, fóruns, atividades práticas e interação com os demais participantes do curso.

Cada um dos nove pesquisadores envolvidos no projeto passou 15 meses observando, conversando e descrevendo o hábito dos moradores do local escolhido para fazer o trabalho de campo. O resultado desse processo é apresentado no decorrer do curso seguindo o roteiro: O que é antropologia das redes sociais?; Qual a aparência das mídias sociais?; O impacto das mídias sociais em política e gênero? e O desafio chinês.

Infográfico sobre sociabilidade escalonável.

Com tópicos específicos sobre abordagem acadêmica em mídias sociais, visibilidade social, selfie, memes, design de plataformas, debate sobre a moral e analfabetismo, política e gênero o material traz uma provocação bastante pertinente sobre a utilização das mídias. E é curioso notar a diferença entre os contextos estudados, como na Itália e China as mulheres tiram poucas fotos de si mesmas ou de outras pessoas nos ambientes, preferem fotografar paisagens, comidas ou compartilhar memes, tudo em detrimento da moral rígida de cada região. 

Para considerarmos o impacto de mídias sociais em áreas como gênero e política, precisamos prestar atenção na natureza das mídias sociais em si – tanto seu design como seu uso subsequente. Esta é uma pergunta central para nosso curso: quanto do que entendemos hoje como mídias sociais é um resultado das intenções por trás do design das plataformas e quanto é resultado da apropriação e criatividade de seus usuários, que podem levar essas plataformas a serem usadas de maneiras que nunca antes haviam sido vislumbradas por seus criadores? (do material)

Embora interessante essa observação, creio que há outros temas relacionados à política e gênero que valem ser citados também. Aqui no Brasil, por exemplo, poderíamos falar de campanhas realizadas via mídias sociais com grande impacto, como a Chega de Fiu Fiu que realizou um mapeamento de locais públicos em que as mulheres são assediadas. Nessa mesma linha tivemos a hashtag #PrimeiroAssedio da qual mulheres compartilhavam as histórias de seus primeiros assédios (aliás é possível ver uma análise sobre a utilização e alcance da hashtag aqui) e a campanha #MeuAmigoSecreto, que a partir de uma alusão ao amigo secreto realizado em época de festas de fim de ano reuniu relatos sobre situações de machismo e misoginia vivenciadas por mulheres sem necessariamente identificar o agressor, posteriormente essa movimentação virou um livro inspirado nas histórias partilhadas nas mídias sociais.

Ou ainda se falássemos de conteúdo e militância na internet e nas mídias sociais, todos os anos o site Blogueiras Negras lança uma lista de mulheres negras que tiverem destaque e impacto no período, as #25WebNegras. Em geral a lista traz mulheres negras profissionais de diversas áreas, pesquisadoras, artistas e várias outras referências. A própria metodologia e critérios de escolha dessas personalidade já seria um tópico a parte para se aprofundar. Segundo o site “a ideia é sempre mostrar aquelas que, como nós, deram o gás pra ter o seu talento visibilizado […]. Não precisamos nem dizer que não é fácil, porque pra gente é três vezes mais difícil, mas mulher negra é especialista em black girl magic e a gente tira leite de pedra, faz brilhar nosso talento com o reflexo do nosso suor”.

Para além do uso político das mídias sociais por mulheres brasileiras, é possível observar o compartilhamento de relatos específicos do dia-a-dia (dependendo do ponto de vista pode também ser um uso político), como a hashtag #maternagem no Twitter e no Instagram ou ainda a hashtag #donasdolar no Instagram onde é possível acompanhar centenas de postagens sobre a limpeza e organização da casa, indicação de produtos, fotos de alimentos preparados e momentos com a família.

Nesses exemplos é possível notar apropriações de uso das mesmas plataformas que, via de regra, mostram as várias realidades das mulheres na sociedade brasileira. Desde as a consequências do constante contato com o assédio, machismo e racismo até os papéis mais tradicionais da vida da mulher como mãe e dona de casa.

Mas pegando o gancho sobre plataformas, todo o curso gira em torno principalmente do Twitter e Facebook, mas a China é um país que censura as principais plataformas de mídias sociais que estamos habituados e isso fez com que os chineses desenvolvessem suas próprias plataformas e, segundo material de aula “91% da população online da China tem uma conta de mídias sociais (comparado a 67% das pessoas nos EUA)”. Lá foi o único país com dois pesquisadores em dois locais diferentes, a China rural e a China industrial, fato que rendeu um módulo inteiro com foco em educação, negócios e privacidade na China.

Dados demográficas das Chinas estudadas na pesquisa.

Enfim, concluí o curso e indico, fica aí a sugestão de material para estudar e se aprofundar em mídias sociais. Além desse material, o projeto Por que postamos tem um website, um acervo de publicações e através da hashtag #whywepost é possível acompanhar comentários de pessoas do mundo todo que estão realizando o curso. 🙂

4 pensou em “Curso – Por que postamos: a antropologia das mídias sociais

  1. Muito bom, Taís! Sempre – SEMPRE! – quis fazer esse curso, mas nunca consegui. Me inscrevi três vezes no ano passado e tenho a vergonha de não ter feito nenhuma edição. Será que esse ano vai? Uma dúvida que eu tenho (duas, na verdade), aproveitando que você fez: 1) o Miller, que encabeça o curso, é bastante “cético” quanto as suas referências de internet/mídias sociais, né? Ele linka bem mais pro lado antropológico da bibliografia, pelo que vi superficialmente. Para você, que fez o curso, isso procede?; 2) Eu sou meio megalomaníaco e quando entro em algo preciso tirar até a última gota restante. Pergunta: com tanto conteúdo disponível (o próprio MOOC, blog posts, livros, etc.), tem como consumir conscientemente e não enlouquecer? PS. Tô amando o blog! <3

    • Oi, oi. Faz siiim. Não é um curso tão profundo, mas conhecimento nunca é demais, né.. Então, tem pouca referência de mídias sociais e é bem mais focado no comportamento mesmo. Como são 9 pesquisadores é bem mais sobre o debate dos resultados do que uma abordagem teórica. E nem todos os pesquisadores participam em igualdade, o moço do Brasil, por exemplo, tem uma fala super rápida, enquanto os dois da China tem um módulo inteiro (mas até que com razão já que a China tem um contexto bastante diferente dos demais países pesquisados). Sobre conteúdo, eu não explorei ainda as outras opções (livro, canal, site) etc, mas pirar faz parte do processo hahaha!! Obrigadaaaaa pela visita! <3333

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