Discurso de ódio e a violência política contra mulheres negras

O Instituto Marielle Franco, criado por familiares da vereadora carioca após seu brutal assassinato, lançou recentemente a pesquisa A violência política contra mulheres negras. O estudo inédito realizado com candidatas negras das eleições municipais de 2020 teve, ao todo, 142 participantes de 21 estados de todas as regiões do Brasil e de 16 partidos. Importante pontuar que todas elas estavam comprometidas com a Agenda Marielle Franco, os compromissos com práticas e pautas antirracistas, feministas e populares a partir do legado de Marielle.

A pesquisa aponta as mais recorrentes violências sofridas por mulheres negras no período eleitoral de 2020. A violência virtual foi a mais citada entre as entrevistadas, com 78%. Dentre estas violências virtuais os atos ocorridos são o recebimento de mensagens racistas, machistas, misóginas ou LGBTfóbicas nas redes sociais e por e-mail, invasão e ofensas em reuniões virtuais ou lives, as candidatas foram alvos de desinformação, hackeadas em perfis pessoais nas redes sociais ou em seus dispositivos eletrônicos.

O discurso de ódio é um problema complexo e interdisciplinar com crescimento a cada ano, Trindade (2020) analisou 506 matérias jornalísticas que continham o termo “discurso de ódio” entre os anos 1993 e 2018. O pesquisou constatou que é a partir de 2012 em que ocorre mais matérias com o termo, com 92,6% citações até 2018. Para Trindade, o fato se relaciona com a expansão das plataformas de mídias sociais e reforça a urgência do debate sobre o tema no contexto digital global.

Para o autor, há uma ‘nova ordem mundial’ a partir de 2012, onde discurso de ódio tornou-se parte do cenário digital global. No Brasil se destaca o discurso de ódio de cunho racista contra pessoas negras, principalmente em razão das plataformas de redes sociais representarem a arena contemporânea para a construção, disseminação e reforço de valores distorcidos, ou seja, outros mecanismos de perpetuação das desigualdades sociais e raciais. Trindade avalia que esse discurso de ódio é mais contundente quando se trata de mulheres negras que ascendem socialmente ou passam a ocupar ‘espaços de privilégio e poder’, suas conquistas são ridicularizadas e desqualificadas.

Para Ruha Benjamin visões de desenvolvimento são construídas a partir de formas de subjugação social e política que constantemente atualizam suas técnicas de dominação. Para a pesquisadora:

A tecnologia não é apenas uma metáfora racial, mas um dos muitos meios pelos quais as formas anteriores de desigualdade são atualizadas. Por esse motivo, é vital que os pesquisadores façam um balanço rotineiro das ferramentas conceituais que usamos para entender a dominação racial (2020, p.19).

Acesse e baixe o relatório completo aqui. 

Referências:

BENJAMNI, Ruha. Retomando nosso fôlego: estudos de Ciência e Tecnologia, Teoria Racial Crítica e a imaginação carcerária. In SILVA, Tarcízio (org). Comunidades, Algoritmos e Ativismos Digitais: olhares afrodiapóricos. LiteraRua: São Paulo, 2020.

TRINDADE, Luiz Valério P. Mídias Sociais e a naturalização de discursos racistas no Brasil. In SILVA, Tarcízio (org). Comunidades, Algoritmos e Ativismos Digitais: olhares afrodiapóricos. LiteraRua: São Paulo, 2020.

Identificando notícias falsas e promovendo uma comunicação cidadã

A oficina “Identificando notícias falsas e promovendo uma comunicação cidadã” esteve entre as 32 oficinas do ciclo 2020 do Programa Agentes de Governo Aberto da Prefeitura Municipal de São Paulo. A atividade teve como objetivo compartilhar técnicas de checagem dos fatos e despertar no cidadão o seu importante papel na luta contra a disseminação de desinformação e discurso de ódio, além de dar insumo para o desenvolvimento de uma comunicação correta, transparente e cidadã.

Dentre os conteúdos, passamos por aspectos da comunicação e democracia, desinformação e discurso de ódio, o papel das plataformas de mídias sociais e buscadores, checagem dos fatos, contra-narrativas em rede e dicas de checagem na prática.

Passada o período do ciclo, deixo abaixo a apresentação utilizada e uma pasta de referências bibliográficas com mais de 50 artigos, livros e relatórios de institutos de pesquisa com acesso a quem tiver interesse.


Destaques da narrativa: do individual ao coletivo

A primeira tarefa de aquecimento da oficina foi a aplicação do Quiz das Fake News composta por 10 manchetes entre notícias verdadeiras e notícias do Sensacionalista para simular uma fake news (e para não reforçar o espalhamento de desinformação). Cada acerto valia 1 ponto, cerca de 340 pessoas participaram do quiz e o resultado médio ficou entre 5 e 6, como pode ser visto no gráfico abaixo.

Há determinados recortes na condução das reflexões e exemplos, sobretudo a partir da ideia de lugar de negro de Lélia Gonzalez e da concepção de que o discurso e a linguagem também são uma forma de violência. Portanto, alguns dos trabalhos utilizados como referência são:

Debates em torno de aspectos políticos e legislativos também foram abordados, a exemplo do plano de ação da ONU para o enfretamento do discurso de ódio e a discussão da PL das Fake News aqui no Brasil, sobretudo a partir dos apontamentos da Coalizão Direitos na Rede.

Além disso, ferramentas e a educação midiática são evidenciadas como importantes elementos na luta contra a desinformação e o discurso de ódio, como o Redes Cordiais e o Guia para influenciadores digitais nas eleições 2020, realizado em parceria com o InternetLab. Sobre ferramentas, foi disponibilizada a SMAT tool (Social Media Analysis Toolkit) para análise de trends e identificação de possíveis ações de bot e espalhamento de desinformação e o Disinformation Tracker que traz um mapeamento dos debates em torno do tema no continente africano.

Por fim, porém não menos importante, de que maneiras ficar atento e contribuir para a diminuição de compartilhamento de desinformação e discurso de ódio no dia-a-dia:

Redes Cordiais lança Guia de Impacto da Educação Midiática

O Redes Cordiais lançou na semana passada o Guia Prático para capacitar cidadãos a aplicar com autonomia métodos de mensuração de impacto a projetos de educação midiática. Organizado por Eduardo Fraga e Monique Lemos, o guia conta com contribuições de pesquisadores e especialistas como Pedro Burgos, Pablo Ortellado, Sérgio Lazzarini, Claudia Costin, Cíntia Gomes, Luiz Futuro e um artigo meu sobre as práticas adotadas nas oficinas sobre desinformação e discurso de ódio no Programa Agentes de Governo Aberto.

A oficina “Identificando notícias falsas e promovendo uma comunicação cidadã” teve como objetivo compartilhar técnicas de checagem dos fatos e despertar no cidadão o seu papel na luta contra a disseminação de notícias falsas e discurso de ódio. O artigo presente no guia traz, a partir da ideia de competência midiática de Ferrés e Piscitelli (2015), algumas percepções prévias das atividades aplicadas no decorrer da oficina, como o Quiz das Fake News e suporte audiovisual como a série sobre fake news da Gabi Oliveira em parceria com a Avaaz.

Acesse aqui para baixar o material.