Relações Públicas no contexto das mídias sociais

No ano de 2014 as Relações Públicas completarão 100 anos no Brasil. Nesse período muitas coisas mudaram na comunicação, desde a maneira como ouvimos música: da vitrola, rádio, discos, walkmans, mp3 ao iPod; a maneira como consumimos entretenimento: da televisão tubo em preto e branco, a televisão à cores, Lcd, plasma, smart TV; a forma como lemos os livros: dos impressos, online e leitores digitais; Entre tantas outras evoluções midiáticas.

A comunicação das organizações, dos profissionais e os relacionamentos acompanharam tais mudanças, principalmente nas últimas duas décadas com a presença cada vez mais importante e maciça da rede mundial de computadores conectados. E o que muda para as Relações Públicas nesse novo cenário?

Destaco aqui três pontos de vista relacionados às Relações Públicas que considero indispensáveis: a atuação do profissional no ambiente digital e o uso dos canais; a presença dos públicos no ambiente digital e usuários dos canais; e o ambiente digital e os canais para a valorização da profissão.

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A atuação do profissional no ambiente digital e o uso dos canais

Uma rápida leitura do ambiente digital: múltiplas mídias (texto, imagem, vídeo, música), vários canais (site, blog, redes sociais, fóruns, comunidades de conteúdo), possibilidades de audiência (nicho e segmentação), a conexão mundial (diversas culturas, informações em tempo real independente de distância etc.), a contraposição com a mídia de massa (os usuários são também produtores de conteúdo), a junção com a mídia de massa (o fenômeno da segunda tela).

E uma dezena de outras possibilidades cabíveis no ambiente digital, ambiente este que, por maior que tenha a tecnologia envolvida, trata-se de pessoas (públicos), relacionamentos e expectativas. Relacionamento pessoa-pessoa, pessoa-organizações, organizações-pessoa, organizações-organizações. E expectativas de obter informações, entretenimento, novidades, serviços, produtos, atendimento e assim por diante.

Sabemos qual é a atuação do relações-públicas, mas cabe uma definição mais técnica, na Classificação Brasileira de Ocupações as Relações Públicas estão alocadas na família 1423 – Gerentes de comercialização, marketing e comunicação. Algumas atividades dessa família são:

  • Estabelecer políticas e procedimentos de comunicação;
  • Estabelecer metas e indicadores de desempenho;
  • Detectar expectativas e necessidades;
  • Pesquisar comportamentos, opiniões e hábitos;
  • Analisar contexto;
  • Elaborar recomendações de ações e soluções;
  • Relacionar-se com a mídia, órgãos governamentais, entidades de classe e associações;
  • Realizar eventos (feiras, convenções, congressos, seminários);
  • Mediar conflitos;
  • Encaminhar solicitações aos responsáveis;
  • Estabelecer diálogo;
  • Acompanhar atuação da concorrência;
  • Monitorar relacionamento com clientes internos e externos;
  • Acompanhar questões públicas (leis, decretos, opinião pública);
  • Gerir nível de satisfação do cliente;
  • Dar suporte na elaboração do plano estratégico da organização;
  • Elaborar relatórios;
  • Redigir comunicados, requisitos, normas e procedimentos.

Algumas competências:

  • Liderar pessoas;
  • Demonstrar capacidade de negociação;
  • Tomar decisões;
  • Demonstrar capacidade de abstração;
  • Trabalhar em equipe;
  • Demonstrar capacidade de raciocínio analítico;
  • Demonstrar capacidade de síntese;
  • Demonstrar capacidade de relacionamento interpessoal;
  • Demonstrar flexibilidade;
  • Agir com empatia;
  • Demonstrar capacidade de organização;
  • Demonstrar habilidades comunicativas;
  • Demonstrar criatividade;
  • Saber ouvir;
  • Demonstrar visão sistêmica;

Analisando as últimas 15 vagas para Analista, Coordenador e Gerente de Mídias Sociais anunciadas no site Trampos.co, referência em oportunidades relacionadas  ao ambiente digital, temos como principais competências e atividades:

  • Relacionamento com consumidores, clientes e influenciadores;
  • Planejamento, produção e edição de conteúdo para mídias sociais;
  • Gerenciamento de comunidades;
  • Gerenciamento de equipes;
  • Produção de relatórios de desempenho;
  • Alinhamento de expectativas;
  • Gestão de deadlines;
  • Conhecer e utilizar plataformas de relacionamento online;
  • Conhecer ferramentas de analise e monitoramento;
  • Conhecer os serviços digitais (SEM, SEO, e-mail marketing, mídia, Ads);

Em relação à atuação do profissional e as mídias sociais o que muda é apenas o ambiente, levando em consideração que as competências já são estimuladas na academia e aperfeiçoadas com a atuação cotidiana.  As competências desenvolvidas vão de encontro às competências exigidas na gestão das novas mídias, planejamento, relacionamento e são atividades já conhecidas da categoria, mas vale enfatizar que no ambiente digital a intensidade e velocidade de interação, viralização e repercussão mudam consideravelmente.

Cada minuto pode ser diferente, pode estourar uma crise ou surgir uma oportunidade única de comunicação. Além desses aspectos o conteúdo é a “menina dos olhos” nas mídias sociais, pois, com o planejamento a médio/longo prazo adequado ao público da marca é possível estabelecer um relacionamento contínuo.

Para isso é importante conhecer os canais, suas vantagens e desvantagens, seu potencial e utilidade. Site, blog, canal no Youtube, página no Facebook ou Google Plus, perfil no Twitter, LinkedIn, no Instagram, no Pinterest, no Skoob, no Filmow etc. São várias opções de mídias sociais, mas antes é necessário saber se é válido utilizá-las todas ou apenas algumas, onde está seu público, quem vai gerir os canais e com que frequência.

Uma ação de social media pode ser um exemplo louvável ou pode ser um grande fiasco, o que diferencia esses dois pontos é o preparo do profissional responsável pelo desenvolvimento das atividades e sua equipe.

Públicos no ambiente digital e usuários dos canais

Quais são as solicitações rotineiras do consumidor?  Informações e dúvidas sobre o produto ou serviço antes da compra, solicitações durante o atendimento e em determinadas ocasiões, reclamações. No ambiente digital essas solicitações também existem, mas o que muda, como já citado acima, é a velocidade – um conteúdo pode ser replicado milhares de vezes em poucos minutos; o alcance – esse conteúdo pode ir muito além dos limites geográficos e/ou memória – tudo será catalogado pelo Google ou até mesmo um print pode fazer memória do ocorrido.

Segundo pesquisa realizada e divulgada pelo IBOPE Media em janeiro de 2013, o Brasil possuía 53,5 milhões de usuários ativos de internet, desses 46 milhões (86%) estão nas redes sociais ou em comunidades como blogs, microblogs e fóruns. É pouco se pensarmos no total de habitantes do país, mas a tendência é de crescimento desses números a cada ano. E são para essas 46 milhões de pessoas que a comunicação deve ser elaborada. Além da rotina de gestão da comunicação no ambiente digital é preciso atentar-se para crises e conversas/relacionamento. É preciso planejar para poder improvisar. E improvisar significa lidar com ocasiões como estas:

Dicico e o Dia de fúria: O educador Rodrigo Ciríaco fez uma compra de R$ 4 mil na loja. Não recebeu os produtos. O atendimento foi negligente com seu pedido de entrega. Rodrigo decidiu comprar na concorrência e exigiu reembolso, o que não ocorreu. Num dia de fúria Rodrigo foi à loja da Dicico e quebrou tudo o que pode e ao mesmo tempo gravou tudo e upou no Youtube. O vídeo, que foi postado no dia 26 de junho, já tem mais um milhão de visualizações e ainda está no ar. A ação da Dicico foi publicar uma nota contando sua versão do caso e informando que solicitou a retirada do vídeo. Você, relações-públicas, ia apenas publicar uma nota nesse caso?

Ecolave e Lívia Leitão: A Lívia perguntou na página da empresa quanto custava para lavar 8 edredons, a empresa respondeu e um amigo de Lívia comentou (brincando) no tópico que cobraria menos. A Ecolave tomou as dores e ofendeu o moço que fez o comentário e o pior, fez trocadilhos ofensivos com o sobrenome da moça, “Leitão”. Na época, em 2011, esse tópico virou febre em questão de minutos e a Ecolave, em vez de se desculpar, continuou com as ofensas. Provavelmente não era um profissional cuidando daquela conta, e a atitude não foi sensata.

PontoFrio e o Pin: O PontoFrio é figurinha carimbada quando o assunto é bom exemplo de gestão de mídias sociais, e não é para menos. A interação, as sacadas, as hashtags, o atendimento e a rapidez do perfil da empresa são incríveis. Um dos diferenciais do Pontofrio é a personagem criada para dialogar com o público, o Pin <3, e o tom de voz adotado, sempre com muito bom humor e empatia. Segundo o Coordenador de Marketing da Nova Pontocom, Guilherme Perez, em 2012 foram 20 milhões de faturamento com ações em mídias sociais, eis um ótimo exemplo de ROI em social media.

Prefeitura de Curitiba: Um perfil governamental é um desafio bem mais delicado que uma empresa ou personalidade, visto pelo lado burocrático de encontrar respostas ou pelo alto nível de críticas. Mas a Prefeitura de Curitiba tem feito um trabalho sensacional nas mídias sociais. Estimula a interação, o engajamento e tudo com humor inimaginável para um perfil governamental.

Observando o caso da Dicico, especificamente, é possível notar que a falha na comunicação ocorreu em outros setores, no atendimento offline, logística, financeiro etc. e a crise estourou nas mídias sociais, pois foi o espaço encontrado pelo consumidor para ser ouvido. Desse ponto de vista vale lembrar que é imprescindível o alinhamento da comunicação integrada, não adianta o digital fazer um trabalho exemplar enquanto o atendimento no balcão for terrível, e vice versa.

O ambiente digital e os canais para a valorização da profissão

Quantos blogs sobre Relações Públicas você conhece? Quantos profissionais estão nos grupos no Facebook, LinkedIn ou outros fóruns com essa temática? Todos esses canais são importantes para a valorização da profissão, para diálogos, troca de experiências e divulgação.

A experiência dos quatro anos do Versátil RP foi e é muito determinante, pois nos mantém próximos da profissão, estudando, pesquisando, escrevendo e conversando com profissionais de longa caminhada. Aliás, esse talvez seja o principal beneficio do blog, o contato com mentores e ótimos exemplos da categoria. No Conbragems, por exemplo, temos profissionais dos quatro cantos do país compartilhando suas experiências e pelo menos 80% deles já tinham algum tipo de relacionamento online, através de blogs e redes sociais. Se o network é a “carta na manga” do relações-públicas, o ambiente digital é um ótimo case de sucesso.

Temos exemplos muito bons da valorização do profissional para o próprio RP e estudantes, talvez o próximo passo seja transmitir a essência das Relações Públicas para o mercado, nós já sabemos quem somos e o que fazemos, o recrutador talvez não saiba tão bem. Uma das funções do relações-públicas é traduzir dialetos da maneira mais simples possível, por exemplo, fazer com que termos do Direito e Medicina sejam entendidos por leigos. Será que essa é a hora de sermos tradutores dos nossos próprios dialetos?

* Artigo publicado no Versátil RP em Julho de 2013 para o Conbragems

Referências.

Links:

Livros:

  • Mídias Sociais e agora? – Carol Terra
  • Cartas a um jovem relações-públicas – Lala Aranha
  • A cultura digital – Rogério da Costa
  • A sociedade em rede – Manuel Castells
  • Relações Públicas Digitais – Organizado por Marcello Chamusca e Márcia Carvalhal

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